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O que é estenose mitral?
A estenose mitral é uma doença crônica e progressiva, causada principalmente pela febre reumática. Os surtos inflamatórios reumáticos ocasionados pelas faringoamigdalites bacterianas (Estreptococo Beta Hemolítico do grupo A de Lancefield) acometem predominantemente o tecido valvar mitral, levando à inflamação crônica, fusão das comissuras, espessamento dos folhetos valvares e calcificação de todo aparato valvar.
Esse modelo fisiopatológico compromete a função da valva mitral, gerando resistência ao fluxo sanguíneo transvalvar mitral, redução da mobilidade dos folhetos e suas consequências hemodinâmicas. É característico da estenose mitral acometer jovens, comprometendo muito cedo a qualidade de vida e muitas vezes a vida produtiva dessas pessoas.
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Outras causas de estenose mitral
A grande maioria dos casos de estenose mitral são causados pela febre reumática,
embora existam relatos de outras doenças acometerem a valva mitral. São
elas:- Estenose mitral congênita
- Doenças infiltrativas mucopolissacaridoses
- Lúpus eritematoso sistêmico
- Artrite reumatoide
- Endocardite infecciosa
- Síndrome carcinoide
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Sintomas da estenose mitral
Nas fases iniciais da estenose mitral não há sintomas. Passam-se longos anos até surgirem os primeiros sintomas. Geralmente, quando aparecem, o comprometimento da valva mitral já é importante. O principal sintoma é a falta de ar aos esforços, que progride até aos mínimos esforços. Falta de ar para deitar-se é um sinal de comprometimento mais importante.
Palpitação é outro sintoma frequente, pois a sobrecarga imposta ao coração, especialmente ao átrio esquerdo, predispõe às arritmias atriais, principalmente a fibrilação atrial. Não é incomum os pacientes descompensarem e manifestarem falta de ar no primeiro episódio de arritmia. Dor torácica é outro sintoma que pode aparecer nos pacientes com estenose mitralbimportante, principalmente nos pacientes com hipertensão pulmonar secundária à estenose mitral.
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Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico é feito através da história clínica e do exame físico. Os sintomas relatados acima, quando presentes, associado ao histórico de faringoamigdalites frequentes na infância, eleva a suspeita diagnóstica. Exame físico bem feito, com ausculta de um sopro cardíaco com características específicas, é a ferramenta clínica mais importante para formular a hipótese diagnóstica da estenose mitral.
Eletrocardiograma, radiografia de tórax e ecocardiograma são suficientes para confirmar o diagnóstico da estenose mitral e graduá-la. Contudo, exames laboratoriais, Holter, ecocardiograma transesofágico e cateterismo são ferramentas utilizadas caso a caso.
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Qual é o tratamento da estenose mitral?
As medicações utilizadas no tratamento da estenose mitral visam a melhora dos sintomas e a prevenção das complicações, no entanto não são capazes de melhorar a obstrução mecânica da valva mitral. A persistência dos sintomas e/ou a grande elevação da pressão pulmonar direciona a terapêutica para o tratamento intervencionista, valvuloplastia percutânea ou cirurgia.
- Diuréticos: diuréticos e restrição hidrossalina são importantes para o tratamento da congestão pulmonar, quadro muito comum nos pacientes com estenose mitral. Os diuréticos mais utilizados são a furosemida e a espironolactona.
- Controle de ritmo e frequência cardíaca: uma das terapias mais importantes na estenose mitral, é o controle do ritmo e da frequência cardíaca. Arritmias atriais são comuns na estenose mitral, principalmente a fibrilação atrial e quando se manifestam com frequência cardíaca alta desadaptam a função cardíaca, geram maior acúmulo de líquido nos pulmões e pioram os sintomas. Portanto, usar medicamentos que controlam a frequência ou até mesmo o ritmo cardíaco são fundamentais no controle clínico dos pacientes com estenose mitral. Os betabloqueadores, entre outros, são os medicamentos mais utilizados nesse contexto.
- Anticoagulantes: os anticoagulantes são medicamentos muito utilizados também. Os pacientes que já manifestaram fibrilação atrial e/ou algum evento embólico ( exemplo AVC ), devem utilizar anticoagulantes, assim como pacientes que apresentam coágulos dentro do coração visualizados pelo ecocardiograma. O anticoagulante de escolha utilizado nos pacientes ambulatoriais é a Varfarina sódica.
- Profilaxia secundária: não podemos esquecer da profilaxia secundária para febre reumática com penicilina benzatina. Pacientes com estenose mitral devem receber profilaxia com penicilina benzatina a cada 15 dias, nos primeiros dois anos do último surto reumático, e a cada 21 dias nos anos subsequentes até os 40 anos de idade, geralmente. Para os alérgicos à penicilina há alternativas.
- Cateterismo – valvuloplastia mitral percutânea por catéter balão: esse é o procedimento de escolha nos pacientes com estenose mitral importante, sintomáticos e/ou com elevação da pressão pulmonar. Devem ser avaliados detalhadamente através do ecocardiograma para a definição do Escore de Wilkins. Wilkins favorável, ou seja, menor ou igual a 8, favorece a valvuloplastia mitral percutânea por catéter balão. Nos grandes centros em que há experiência no procedimento, a valvuloplastia possui índices baixos de complicações (0,5 a 2 %) e mortalidade (0,5%). As principais contraindicações para o procedimento são a existência de insuficiência mitral moderada a importante, trombo dentro do coração e escore de Wilkins maior ou igual a 12.
- Cirurgia comissurotomia valvar mitral: esse procedimento é reservado aos pacientes sintomáticos e/ou com hipertensão pulmonar importante não elegíveis para a valvuloplastia mitral por cateterismo. Consiste na “plástica” da valva mitral, principalmente reduzindo a quantidade excessiva de cálcio e liberando as comissuras fundidas pela doença, melhorando a mobilidade e a abertura da valva mitral. Geralmente os resultados são muito bons e os riscos são inerentes a uma cirurgia cardíaca.
Devemos saber que a febre reumática “lambe as articulações e morde o coração“ e a valva mitral é uma das principais vítimas da cardite reumática. O mais importante para a diminuição da incidência da doença é realizar adequada profilaxia primária, impedindo que os indivíduos suscetíveis venham a contrair a doença. Assim, é necessário um esquema eficaz não só de tratamento, mas de prevenção das faringoamigdalites pelos estreptococos.